Eu lembro de quando te vi pela primeira vez. Lembro também de não ter dado nada por você. Nada mesmo. Eu pensei “ele é a minha despedida de solteira”, porque eu poderia jurar que estava prestes a entrar num outro relacionamento. Lembro que você bebeu um pouquinho e, eu, apenas uma dose de coragem. E a gente se beijou. Na chuva. Pelas circunstâncias e não por romantismo, óbvio. Não sou romântica há uns bons anos. Você, bem, eu acho que não conheço nada de você. Às vezes, penso estar sozinha, conversando com meus fantasmas, com algum tipo de assombração, mas você está ali: mesmo que distante. E, talvez, haja até fundamento nessa história de fantasma, porque você tem sido o meu. Fico aterrorizada.
É que eu ainda não sei lidar com esses dois que você tem sido. É que, sabe, nem parece aquele cara que beija o meu olho, e a pontinha do meu pé, e a minha boca, de leve; o que sussurra no meu ouvido um “você chegou na hora certa”. Não vamos ao cinema. Nem ao parque. E sequer aparecemos juntos na frente dos seus amigos. Nem parece que meu celular já acordou algumas vezes no seu criado mudo e que sua mãe sabe que eu gosto de chocolate ao leite.
Seu irmão me olha com uma cara de “é, eu sei de vocês” e eu respondo com a minha cara de “mas eu não sei”, já que, ultimamente, só tenho essa expressão: de quem não sabe. Isso contradiz a minha personalidade e a minha independência, e o meu juízo e, quem sabe, minha sanidade mental, mas eu não sei, juro. Você deixa poucas pistas no caminho e já não sei decifrar suas meias palavras enigmáticas.
Mas, mesmo assim, eu gosto de como você me olha. E de como solta meu cabelo quando estou de rabo de cavalo. E de como solta a minha risada, presa pela fadiga e pela incerteza. Gosto de lembrar de como foi a primeira vez que pisei na sua casa e, não tanto, de lembrar do dia que fiquei acordada sozinha durante uma madrugada inteira. Ao seu lado. Mas sozinha. Tinha um nó na garganta e outro no peito. Chorei baixinho.
E, entre os nossos encontros, agora espaçados, separados por semanas, eu sinto falta do cheiro do seu casaco e da sua companhia. Mas, nos últimos tempos, tenho sentido muito mais falta da sua companhia quando estou com você. Que, eu sei, não está comigo. Nem com ninguém. Eu não quero ser piegas. Porém, como bem sabe (afinal, já estava previsto no contrato “se envolver comigo”): eu sou piegas.
Nunca me contentei com pouco. Nos últimos meses tenho te arrastado, tenho arrastado suas metades. E por mais que eu goste do jeito que sei que me olharia, caso estivesse te dizendo isso e te encarando nos olhos, eu gosto um pouco mais da minha paz. De mim. Do meu batom vermelho e das minhas amigas do colegial. Eu até sentiria muito, se você não sentisse nada. Cuide-se. E, ah, diga para sua mãe que o café dela é delicioso.