Ninguém






































                                        Leia ouvindo "Nobody", da Selena Gomez. 

 Eu me sinto um pouco sufocada por todas estas perguntas e pelo medo do que está por vir. Mas, ontem a noite, você esteve aqui e instantaneamente as coisas se acalmaram. Você sempre me mostra o caminho e segura minhas mãos para que siga segura por ele. E, em meio a toda a minha insegurança e aos meus muitos complexos, você acaricia meus cabelos e diz: "você é quem sonha e não o que dizem". Queria que todas as pessoas pudessem sentar a sua frente e te ouvir falar. Porque ninguém jamais me amará como me ama.

 Quando já é tarde e todos foram dormir, eu deixo os sentimentos escaparem e, involuntariamente, me sinto sozinha e perdida. Mas você lê os meus pensamentos e ouve minhas perguntas a mim mesma, feitas em voz alta e cheias de dúvida, e me pede para esperar pelo melhor. Eu gosto de ser ninada por você e logo caio no sono, com a leveza de uma criança e a segurança de quem é amada e protegida. Ninguém me entende como você.

 E quando escapo dos assuntos boêmios de algum barzinho e vou ao banheiro, olhar no espelho e tentar enxergar quem realmente sou, você vai até lá para me lembrar do que conversamos antes de dormir. Você me lembra de que o meu lado bom sempre vence o confuso. Volto para fora com a certeza de que um dia vou despir as camadas que me cobrem e sufocam, para ser somente a garota que você conhece. Afinal, ninguém me conhece tanto quanto você.

 Às vezes, me pergunto por que, onde e quando. "Por que ainda não?", eu digo antes mesmo de abrir os olhos. A culpa me consome. E você me abraça, em silêncio, atestando que a paz deve ser o remédio para a espera. Eu viro os relógios para a parede e aboli os calendários desta casa, só para não ser corroída pela expectativa. Mas parece que você apressa os ponteiros e me distrai com o resto da vida. Ninguém consegue driblar tanto o tempo.

 E, hoje mesmo, eu pedi ajuda para ir embora, te implorei para fugir. Você me negou o pedido. Disse-me que a pessoa que luto todos os dias para ser, sai pela porta da frente com saudações de despedida e um "volte sempre" e que será assim comigo em breve. Eu aguardo esse "em breve" com todo o meu coração, com muita convicção de que, sim, eu vou e iremos juntos. Porque ninguém está tão presente em mim quanto você. Eu me nego a acreditar que exista alguém como você, porque, realmente, não há.

Imagem: We Heart It

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Sozinha


Leia ouvindo esta música!

 Olhei para a cama gigante, nunca esteve tão convidativa. Duas taças de um vinho português e o quarto parecia absurdamente quente. E vinho sempre causa duas coisas: coragem e sono. Eu tirei a calça e me atirei. Estava, enfim, sozinha. Sozinha com essa cidade cheia de luzes e cheiro de maresia. Deitei e vi no teto um retroprojetor da minha mente confusa. Não adiei nada: revirei cada acontecimento, cada “tchau”, todos os “nãos”, as bocas, os meses e as indecisões. Eu estava em um lugar em que as pessoas sequer sabiam meu nome, porém, apenas de uma coisa não podia fugir: de mim mesma. Era a hora de me despir. Água gelada e cabelos molhados – e, também, sentimentos expostos. Todos refletidos no espelho. Os quilos a mais não negam que troquei a aparência pelos meus sonhos.

 Voltei para o quarto e sussurrei: “enfim a sós” e dei uma piscadela para a minha própria imagem no guarda-roupa. Conheci uma nova série e fiquei dividida entre o mocinho e o vilão. Fui ao cinema e usei três cadeiras para deitar. Gargalhei alto e troquei sorrisos com um funcionário na saída. Comi todas as porcarias que amo e perdi dois quilos caminhando todos os dias na orla durante o por do sol. E pensei em entrar no mar a noite.

 Confrontei-me sobre os próximos meses, mas me distraí comprando livros novos. E esbarrei três dias com um cara que, no final, acabou deixando seu perfume no meu vestido. Ri, sozinha, do quanto minha vida parece um filme adolescente. Desejei ficar pela primeira vez e até fiz uns planos de conhecer os bares na rua da faculdade. Ou ficar assistindo filme e dividir a pizza com uma nova pessoa. E ela me pediu para ficar mais um pouco ou, quem sabe, voltar de vez.

 Não respondi nada. Não posso falar sobre pessoas e futuro agora que, finalmente, tenho conseguido ser alguém real. Mas também não desejo ser como as que me fizeram demorar a me tornar isso. Sozinha, eu tenho ido longe, porque ninguém me pede para esperar um pouco. Não tenho precisado carregar nada nas costas e tenho andado rápido graças a isso. Sozinha, com todos os tempos verbais e existenciais, descobri que é um grande presente vivê-lo.

 Volto para casa em breve, minha mala é bem pequena para os meus padrões e, o que não cabe nela e no peito, eu abandonarei aqui. E, por incrível que pareça: não há quase nada sendo deixado para trás, porque a bagagem jamais esteve preenchida por tantas coisas boas e concretas. 


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Cidades grandes e nós dois


 Estou em mais uma cidade grande, tirando férias da minha pacata vida de garota do interior – e sei que faria uma observação: sou uma garota do interior apenas por morar nele, porque na prática sou uma garota-mundo. Você me deixa constrangida com essas expressões enigmáticas meio elogiosas. Eu costumo ser mais objetiva e falo logo da sua barba e da sua, aparentemente, inesgotável paciência. Mas, voltando a metrópoles e prédios: sempre que os vejo, lembro daquelas coisas que me diz a cada fevereiro sobre morar em um deles somente até ter dinheiro para comprar uma casa e ter uns dois ou três filhos e a menina, ah, a menina vai se chamar Sophia, e você tem pavor de um dia ela chegar em casa dizendo que arrumou um namoradinho. Ouço isso desde os quinze anos, quando ainda tinha coragem de usar um lacinho de pérolas no cabelo; e agora já estou aqui: crescida e ligando aos prantos para uma amiga, para dizer que é difícil passar tanto tempo sozinha longe. E, toda vez que é você quem está do outro lado da linha, me diz “calma, meu bem. Tudo vai se acertar”. Odeio que acredite tanto assim no destino. Principalmente no nosso.

 Não que eu descarte definitivamente ser dona de uma dessas janelinhas acesas lá no alto junto a você. Só não quero parecer menos dona dessa decisão por nos deixar tão nas mãos do futuro. Você nunca foi o meu “com certeza”, mas seria uma bela cereja do bolo em que botei a mão na massa para fazer. E cá estou: sentada em frente ao forno, esperando-o ficar pronto, enquanto você ainda acha cedo demais para saber se pode ou não estar em Paraty no próximo carnaval.

 Por todas estas coisas e algumas outras, invejo seu trabalho. Você investe o seu tempo em cuidar de pilhas de papel e deixa as pessoas sob a responsabilidade do destino. Temo por você. Temo pensar que vai amar alguém e irá pedi-la que aguarde um pouco mais até poder comprar uma casa com jardim (e eu sei que irá comprar); e que, depois, dedique-se completamente ao mestrado e, ainda mais a frente, peça-a para esperar você juntar dinheiro para a viagem de aniversário de casamento e que, um dia, chegue em casa e a veja pela última vez, porque esperar cansa e o tempo não brinca de estátua. Eu também não. E é por isso que gosto de cidades grandes: elas nunca me permitem ficar entediada. Elas não admitem inércia sentimental: sempre há algo a ser sentido, seja bom ou ruim. E você não me faz sentir nada novo desde o dia em que te conheci. 

Imagem: We Heart It

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