Abro a janela e... chuva! Adoro acordar ouvindo esse barulhinho que me obriga a ficar um pouco mais na cama. Assisto ao programa matinal, enrolada no edredom. A verdade é que o assunto nem me interessa tanto. É o simples prazer de saber que estou acordada a essa hora só para ouvir o estalos das gotas da chuva.
Levanto na ponta do pé para não acordar o resto da casa, vou tomar meu café da manhã e sem querer esbarro na cadeira. Ai meu Deus, não era pra fazer barulho! Tomo um chocolate quente e resolvo me arriscar, saindo antes das dez nessa chuvinha que pode aumentar. Ih, o guarda-chuva está no quarto dos meus pais. Vou com um casaco bem grosso mesmo.
Fone no ouvido, tocando aquela música bem calminha. Para onde eu ia? Ah, é verdade. Era só um passeio pela cidade que eu sei andar até de olhos fechados. No caminho para a loja de esmaltes, encontro uma livraria. Como nunca reparei a existência dela? Entro e leio o cartaz: foi inaugurada há dois dias. Deveria estar ocupada demais fazendo minhas tarefas, para ouvir o anúncio do carro de som.
Literatura jovem, literatura jovem, literatura jo... Achei! Ainda bem que não comprei pela internet. Ai droga, como eu sou desastrada! É a primeira vez que entro aqui e já deixo o livro cair. Pego, coloco no lugar e continuo andando, como se nada tivesse acontecido. É o primeiro ano que estudo Literatura. É melhor verificar o valor dos livros recomendados pelo professor. Mais uma despesa para os meus pais.
Puxo Dom Quixote exatamente na mesma fração de segundo que uma outra pessoa. Resolvi olhar para trás e pedir desculpas. (E matar a curiosidade de quem é o dono daquela mão, é claro). Cabelo castanho claro e olhos esverdeados. Só por pronunciar a palavra "desculpa", percebo que não é daqui. Educadamente, me cede o primeiro livro e fica com o segundo de uma enorme pilha de exemplares. Sem perceber, engatamos numa conversa sobre a história do livro. Ele diz que essa edição é a mais atual e me explica minuciosamente o seu ponto de vista em relação ao desfecho.
Acabo me sentindo ignorante, afinal, nunca veria por esse ângulo. É aí que o livro me parece ser interessante e resolvo comprá-lo. Naquela conversa de meia hora no café da livraria, acabei não prestando atenção que ele havia trocado os livros. Nos despedimos e agradeci pelas dicas de leitura. Só na metade do caminho, parei embaixo de um toldo e resolvi abrir o livro. O nome dele, o número do celular e uma dedicatória que assim dizia: "pensarei melhor sobre dias chuvosos. Esse mudou meus conceitos". Além de inteligente, ele parecia ser mágico. Em que momento escreveu aquilo?
Fiquei tão feliz e surpresa, que desisti de ir comprar esmaltes e voltei para casa fazendo passinhos de dança na chuva. Quando contei sobre a manhã que havia tido, ninguém acreditou. Acho que nem eu.